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segunda-feira, 25 de abril de 2016

Por que Pedro Álvares Cabral é pouco lembrado em Portugal?

POR WALDIR JUNIOR DE SALVADOR BAHIA
FONTE: De Lisboa para a BBC Brasil


Quadro de Oscar Pereira da Silva que retrata o desembarque de Cabral no Brasil
Passados 516 anos do descobrimento do Brasil, comemorados neste 22 de abril, a importância de Pedro Álvares Cabral para a História do país segue incontestável. Mas sua figura não tem o mesmo peso em Portugal, país que ele ajudou a transformar em uma potência global há mais de cinco séculos.
"A maior parte dos portugueses com mais de 45 anos sabe quem foi Cabral, mesmo que quase todos de forma muito vaga. Já um jovem de 17 ou 18 anos provavelmente responderá que tem uma ideia vaga sobre Vasco da Gama, mas que não se lembra de Pedro Álvares Cabral, um nome que ficou enterrado nos livros do ensino básico", afirma à BBC Brasil a historiadora e escritora Manuela Gonzaga, investigadora do Centro de História d'Aquém e d'Além-Mar (Cham), ligado à Universidade Nova de Lisboa e à Universidade dos Açores.
Cabral foi um personagem central no momento áureo de Portugal, a expansão marítima dos séculos 15 e 16. A sua chegada à costa brasileira, em 1500, foi um dos mais importantes capítulos da História lusa. Mesmo assim, o interesse pelo navegador em seu país de origem fica à sombra de outros exploradores contemporâneos a ele.
"Quando falamos sobre os grandes homens da expansão portuguesa, os primeiros nomes que nos vêm à cabeça são os de Vasco da Gama, o primeiro europeu a navegar para a Índia, de Bartolomeu Dias, o primeiro navegador a atravessar o Cabo da Boa Esperança, e o de Pedro Álvares Cabral. Mas o descobridor do Brasil hoje não é tão conhecido ou estudado como são os outros dois", diz à BBC Brasil o historiador António Camões Gouveia, professor da Universidade Nova de Lisboa.

Monumentos e avenidas

Uma caminhada pelas ruas de Lisboa evidencia a distância entre a popularidade de Cabral e de Vasco da Gama no século 21. O navegador que inaugurou a rota entre Portugal e Índia dá nome a um dos maiores shoppings da cidade e à ponte mais extensa da Europa, de 17,185 quilômetros, que atravessa o rio Tejo, ligando a capital lusa ao município de Montijo.

Em homenagem a Cabral, há uma avenida com o seu nome, onde encontra-se uma estátua em alusão ao descobrimento do Brasil, doada pelo governo brasileiro, em 1941. O monumento é uma réplica de uma estátua existente no Rio de Janeiro.
A estátua de Cabral em Lisboa é uma réplica de um monumento do Rio de Janeiro e foi doada pelo Brasil
"Quando comparamos Cabral a outras figuras da mesma época, notamos que ele realmente está em um segundo plano. A figura de Vasco da Gama sobrepõe-se em termos de visibilidade nos monumentos, nas ruas. Na cidade de Sintra, onde vivo, há várias ruas Vasco da Gama e não conheço nenhuma com o nome de Cabral", conta à BBC Brasil o historiador Paulo Jorge de Sousa Pinto, também investigador do Centro de História d'Aquém e d'Além-Mar.

Vida desinteressante

Segundo os historiadores portugueses, uma das razões para Cabral ocupar hoje um papel de coadjuvante em comparação com alguns dos seus contemporâneos é o fato de o descobridor do Brasil não ser um personagem tão controverso quanto outros navegadores.
"Como não há grandes polêmicas em torno de seu nome, ele é um personagem menos interessante de ser estudado. Não sabemos muito sobre a vida pessoal dele, e os pormenores conhecidos são desinteressantes. Se Cabral tivesse sido um guerreiro, se tivesse comandado uma armada portuguesa no norte da África ou se tivesse se envolvido em alguma das tantas lutas na corte portuguesa de sua época, ele despertaria um interesse muito maior", justifica Sousa Pinto.
"Vasco da Gama tem um lado sombrio que desperta interesse até hoje. Na segunda viagem à Índia, ele revelou uma faceta cruel, ficou conhecido como brutal e controverso, e isso ainda repercute. Mas nada paira sobre a imagem de Cabral. O único aspecto negativo é o de que ele seria azarado, porque sua armada saiu de Portugal com 13 embarcações e voltou com apenas seis", afirma à BBC Brasil António Manuel Lázaro, professor de História da Universidade do Minho.
Cabral e Vasco da Gama estão entre homenageados no Padrão dos Descobrimentos, monumento às margens do rio Tejo, em Lisboa
Na opinião de Sousa Pinto, a presença menor da imagem de Cabral na sociedade lusa moderna também foi influenciada pela ideologia política do Estado Novo português, que durou de 1933 a 1974, ano em que ocorreu a redemocratização do país europeu.
"Durante esse período, a propaganda e a ideologia oficial do regime foram muito centradas na imagem dos construtores do império colonial português na África, como Vasco da Gama e o Infante D. Henrique, principal promotor das viagens do descobrimento. Isso aconteceu porque o regime queria justificar a sua presença nas colônias africanas, que era muito contestada pela comunidade internacional", diz o historiador.
"Nesse caso, a imagem dos simples descobridores, como é o caso do Cabral, acabou por ficar à sombra dos grandes heróis responsáveis por expandir o império português", explica.

Descobrimento foi intencional?

A grande polêmica em torno de Pedro Álvares Cabral é saber se ele chegou à costa brasileira intencionalmente ou por acidente. Para António Gouveia, essa dúvida também causa um impacto negativo à imagem do navegador em Portugal.
"As sombras que existem sobre a descoberta do Brasil acabam por minimizar um pouco a figura do Cabral em termos de estudos acadêmicos e até a visão que a sociedade tem dele próprio", opina o historiador.
"É preciso pensar se o descobrimento do Brasil foi ao acaso ou intencional. Porque se foi intencional há a possibilidade de a descoberta ter acontecido previamente, o que, de certo modo, diminui o papel e a importância de Cabral", argumenta, por sua vez, António Manuel Lázaro.
Pouco se sabe sobre a vida de Cabral. O descobridor do Brasil nasceu entre 1460 e 1470, na vila de Belmonte, e morreu em 1520, na cidade de Santarém. Seu corpo estaria sepultado na cidade, na Igreja da Graça, mas alguns historiadores argumentam que seus restos mortais foram transferidos ao Brasil no início do século 20.
Há um túmulo sem corpo em homenagem ao navegador no Panteão Nacional, em Lisboa, ao lado de outro dedicado a Vasco da Gama, cujos restos mortais encontram-se no imponente Mosteiro dos Jerónimos, também na capital portuguesa.
A ponte mais extensa da Europa, que atravessa o rio Tejo, em Lisboa, recebeu o nome de 'Vasco da Gama'

Cabral e Vasco da Gama também estão lado a lado no Padrão dos Descobrimentos, um monumento às margens do rio Tejo, em Belém, de onde saíam os navegadores durante o período da expansão portuguesa.

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